Existia algo sobre aquela semana que parecia estar lhe fazendo andar em voltas na própria cabeça. O processo de construir uma música do zero na semana seguinte tinha sido exaustivo, sim, mas ai tinha também o processo de ensaiar aquela música e ai encaixar com a sinergia da banda e um novo show. Parecia que nada que ela fazia era o suficiente, que nenhuma ideia que sua mente trazia merecia estar no palco naquele momento. Era um inferno viver na sua mente.

No dia do show ela sabia que só tinha uma solução. A maior parte do dia passou sumida, pegou um carro e arranjou uma lugar isolado pra fazer o que precisava: fumar um beck, relaxar, fazer ioga. Só apareceu de volta pro festival na hora do soundcheck, a alma de volta no lugar, a mente centrada em entregar o melhor não por causa do festival em si mas porque era o que a sua banda merecia.

Provavelmente porque tinha conseguido lidar com seus demônios mais cedo foi que conseguiu enxergar com uma claridade maior como sua banda estava se sentindo. Na reunião pós soundcheck era quase palpável a tensão que aquele oitavo lugar tinha deixado neles após quase um mês de festival. E em parte aquilo era culpa dela. Ela tinha pressionado eles na produção da música pra continuarem ensaiando, ela tinha sugado cada gota de suor e esforço deles pra que aquela apresentação fosse perfeita e agora conseguia ver as consequências das suas ações claramente no rosto dos amigos.

A room409 não tinha líderes, mas ela sabia que a responsabilidade de lidar com aquela tensão e preocupação era dela, ela tinha de acalmar os amigos e lembrar o motivo de eles estarem ali. Então pra começar, ela tinha de atacar o elefante na sala.

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— Antes da gente continuar falando do show, Jae, o que ta pegando? Você parece que vai chorar a qualquer momento e acho que a gente precisa falar disso.

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Era necessário falar mas principalmente pra lembrar a eles que acima de tudo eram família, algo que depois de desabafos e choros entre todos foi mais fácil trazer de volta a mente. Sua mente ficava muito mais clara com o que falar quando via que seus amigos precisavam dela assim, porque era nisso que ela era melhor… cuidar deles.

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— Eu quero pedir desculpas por ter pegado tanto no pé de vocês essa semana, ter cobrado tanto da gente. Eu acho que do jeito que eu agi eu só piorei a tensão de vocês e fiz vocês esquecerem algo essencial: a gente já realizou nosso sonho. Nosso sonho era esse palco que a gente vai subir já já, era esse público que tá ai fora pra ver a gente. A gente ta numa turnê mundial, a gente tem uma gravadora apoiando a nossa liberdade criativa pra colocar nossa música no mundo, a gente tem fã viajando de cidade em cidade pra ver a gente. A gente já ta vivendo nosso sonho, já tamo vivendo de música, nada que vier depois disso vai tirar isso da gente. O que resta pra gente agora é subir naquela porra de palco e colher o fruto dos nossos anos de trabalho duro porque a gente é do caralho, independente do que um ranking semanal tenha a dizer. Eu to orgulhosa pra caralho por a gente ta aqui, eu amo vocês e eu não subiria nesse palco com mais ninguém… E depois do show, a rodada de strippers é por minha conta.

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Entre novas lágrimas e risadas ela finalmente conseguiu sentir eles prontos pra subir e mostrar a Berlin pelo que eles estavam ali.